Análise de cenário

Inteligência Artificial e Discriminação Algorítmica: desafios para o futuro do trabalho

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Por Renato Passos | Co-founder da Juri Capital

A inteligência artificial vem se destacando como uma das grandes pautas tecnológicas no mercado de trabalho. Ela tem se mostrado uma força transformadora para alavancar negócios, otimizar sistemas operacionais e, até mesmo, escalar vendas por meio de atendimentos inteligentes.

À primeira vista, a suposta “imparcialidade” da IA na análise de dados decisórios instiga o debate sobre sua capacidade de substituir o ser humano em funções mais complexas, como na elaboração de decisões judiciais e administrativas ou na redação de peças jurídicas — uma realidade que entusiasma muitos profissionais do Direito 4.0.

Contudo, no “XVII Encuentro Internacional de Abogados Laboralistas y Del Movimento Sindical”, do qual participei como Delegado, o Dr. João Guilherme Wlaski introduziu uma reflexão essencial: a “discriminação algorítmica”.

Partindo do fato de que algoritmos são criados por pessoas para otimizar resultados em objetivos pré-definidos, há o risco de que algumas empresas os programem para estabelecer critérios de exclusão ou penalização de determinados grupos de trabalhadores, ainda que os resultados operacionais desses grupos sejam iguais ou superiores a outros.

É possível observar um exemplo dessa dinâmica em aplicativos como 99 Taxi e Uber, onde o “empreendedor” que recusa três corridas consecutivas passa a receber apenas chamadas de menor valor ou é enviado para o fim da fila, apesar do discurso de autonomia e liberdade de escolha.

Para além do contexto de trabalho em plataformas, outras grandes empresas, especialmente multinacionais, podem se valer de algoritmos na tomada de decisões trabalhistas, como contratação, demissão ou concessão de bônus.

Nesse cenário, os padrões utilizados para criar esses algoritmos podem conter conteúdo discriminatório — desde recusar mulheres ou filiados a sindicatos até demitir pessoas idosas ou com saúde fragilizada.

Levanta-se, então, o questionamento: como auditar e impedir o comportamento predatório de empresas que utilizam essa tecnologia?

O art. 20 da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) assegura ao titular o direito de solicitar a revisão de decisões tomadas exclusivamente com base em tratamento automatizado de dados pessoais, o que inclui critérios que definam perfis pessoais ou profissionais. Essa legislação, inspirada em normas europeias, garante que o trabalhador possa ter acesso aos parâmetros aplicados em decisões que o afetem diretamente.

Como bem lembrou o Dr. João Guilherme, esta será uma das grandes discussões do século nas relações de trabalho: a proteção do empregado diante de potenciais desigualdades, discriminações e descumprimentos normativos decorrentes de algoritmos programados para esses fins.

Conforme enfatizado pelo professor espanhol Antonio Baylos: “A negociação coletiva deve ser o espaço para desmantelar a opacidade destas tecnologias. Não podemos permitir que grandes empresas tecnológicas imponham as suas regras nas sombras”.

Esse debate é de suma importância para que a sociedade civil permaneça alerta e preparada para a defesa de seus direitos. A análise do trabalho não pode se restringir apenas a fatos objetivos, sem antes compreender a origem e a lógica embutida nesses processos automatizados.

É fundamental que associações e entidades civis contem com equipes técnicas preparadas para investigar se as decisões “lógicas” das IAs estão alinhadas às legislações vigentes e se não promovem privilégios ou discriminações contra determinados grupos.

Reconhecemos, é claro, as vantagens e os avanços que a inteligência artificial proporciona. Porém, é essencial adotar um olhar crítico, para que essa inovação beneficie a sociedade como um todo — em vez de criar privilégios para alguns ou impor padrões comportamentais únicos.

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